terça-feira, 11 de setembro de 2012

Uma noite em Paris

Existem alguns sonhos que não sabemos ter. Quando, de repente, um deles desperta do sono, nos vemos presos à vontade de realiza-lo o mais rápido possível. Foi assim com Paris. Nunca, em meus 20 anos passados, quis visitar a Cidade Luz, até eu entrar na faculdade de Jornalismo (uma das melhores escolhas que já fiz na vida). Aprendi nas aulas de História da Arte sobre pintores incríveis, mas um deles chamou minha atenção em especial: Claude Monet. Passei a observar suas obras e a procurar exposições onde suas criações pudessem ser apreciadas, ganhei um livro enorme sobre sua vida e cometi um erro absurdo: assisti Meia-Noite em Paris. De um momento para o outro, me vi desesperada para ir ao jardim do impressionista. Além disso, fui conhecendo cada vez mais o modo como a capital francesa inspirou tantos artistas. Entre pintores, escultores e escritores, algo havia em comum: Paris. Tudo o que eu queria era entender o mistério por trás dessa cidade, inspiradora das mais fantásticas obras da história. A minha outra missão era provar a esse coração, cuja temperatura é um pouco abaixo do normal, que achar um amontado de ferros romântico era o cúmulo do sentimentalismo.

No dia 21 de julho deste ano (2012), finalmente descobri a origem de tamanha inspiração, e aprendi que um amontado de ferro pode deixar mole até a pedra em que nenhuma gota d'água bateu...


Na manhã desse dia decidi que conheceria a Torre Eiffel. Eu havia chegado no dia 19, à noite, quando tudo já estava fechado. Ao acordar, resisti ao monumento e preferi conhecer Paris a partir do lado oposto de onde eu estava, lá da Île de la Cité. Sabia que veria Notre Dame, mas não que me surpreenderia com o Palais de Justice, muito menos que ao atravessar a ilha estaria bem na frente da livraria que planejei conhecer há anos, desde uma roda de debates no Teatro Guarany em Santos, a Shakespeare & Company. Também não pensei que quando começasse a xeretar o 5er arrondissemente, chegaria rapidamente à l'Université de Paris - Sorbonne. E quem diria que no fim da ruazinha abandonada estaria o Pantheon, onde estão os restos mortais de Jean-Jaques Russeau e Voltaire? Com um mapa na mão, confirmei o que já havia deduzido que estava duas ruas à frente, o Jardim de Luxemburgo, e fiquei super animada ao ver que o meu hostel estava em uma avenida que dava de cara com a gigante Rue de Vaugirard - uma das saídas do Jardim. Fiz esse trajeto todo andando.

Do endereço onde eu estava hospedada, do Pantheon, do rio Sena... de todos esses lugares eu vi a Torre Eiffel, mas o encontro oficial esperou duas noites em Paris para acontecer.

21 de julho de 2012. Acordei, tomei banho e pensei (eu não penso assim que acordo, vale ressaltar): "vou colocar uma roupa bonita, afinal, vou conhecer a Torre Eiffel e tirarei fotos. Preciso estar bonita". Aproveitei para usar pela primeira vez algumas das peças adquiridas nas mini compras de Madrid (escala de 13 horas). Eu estava em um albergue bem próximo ao ponto turístico, mais uma desculpa para ir andando (meu objetivo principal era andar até precisar de fisioterapia). Pedi informação para a recepcionista - Jéssica, a única simpática naquele lugar - e segui meu caminho, como se tivesse entendido tudo o que a moça me dissera. Nessa empreitada, parei em uma brasserie e comprei meu pain au chocolat e suco de laranja de todos os dias, na base da mímica, claro, porque nenhum parisiense tinha paciência para entender meu francês de 1 semestre e meio de curso. Ousei, ainda, pedir informação a um local, e por incrível que pareça entendi.

Da Avenue de Lowendal virei à esquerda na Avenue de Suffren. Aí a surpresa: já via a torre mais de perto, não apenas a pontinha dela. Pela lateral da Ecole de Guerre entrei na Place Joffre, e lá estava o Parc du Champ de Mars. De primeira, minha vista foi uma quadra de basquete onde rapazes jogavam com a Torre Eiffel de fundo. Quem me conhece sabe o que uma quadra significa para mim. Logo imaginei que de lá surgiriam futuros Tony Parkers (jogador francês do time da NBA que mais gosto, o San Antonio Spurs). Era o momento perfeito um novo clique. Continuei andando até chegar no Champ de Mars onde tinha uma visão completa dela que é uma das maravilhas do mundo. Realmente, uma maravilha. Virei tiete daquilo que eu dizia ser "um amontoado de ferro". Pedi para um oriental tirar uma foto minha (eles são bons nisso) e continuei em direção à torre, como um pedaço de metal sendo atraído por um imã.


Para a minha alegria, a fila para subir de escada não estava grande. Peguei meu ingresso e comecei a maratona de dois andares... dois andares que, no total, somam uns 115 metros. Antes de pegar o elevador para o topo, parei. Simplesmente parei. Fazia sol, mas estava frio. Eu estava com fome, mas só pude pegar uma baguete e uma garrafa de água, porque lá em cima tudo é muito caro. Eu estava cansada, afinal, andei 115 metros para cima. Mas parei. Sentei. Liguei o iPhone, mesmo com bateria fraca, coloquei os fones no ouvido e escolhi o álbum Gold, da Britt Nicole. Queria dividir aquele momento com alguém especial, e ninguém melhor do que aquele que me deu a viagem de presente: Deus.

Sentada no banquinho antes de pegar mais uma fila, a do elevador para o topo, abri meu Moleskine do Star Wars e comecei a escrever. Assim como escrevo meus sentimentos nesse post, escrevi no caderninho que ganhei de presente surpresa da mamãe. A trilha sonora só me fazia pensar no quão maravilhosa a vida é e como aquele momento era apenas mais um dos tantos que eu teria na vida. O resto da história consiste em subir ao topo, tirar fotos e o iPhone parar de funcionar. Sim, desesperador, porque eu sabia que a bateria não havia acabado por completo. Desci a torre e andei até o hostel. Lá, o aparelho ligou.

Como ainda estava cedo, decidi que iria à Champs-Élysés. Desci na estação Concorde, comecei a seguir para o lado oposto da famosa avenida, pedi informação e virei para o caminho correto. Passei por todas as lojas, comprei meu kit Sephora e, mais uma vez, era atraída como que por um irmã em direção a um monumento. Desta vez, o Arco do Triunfo. Pela segunda vez no dia, meu amigo mapa me mostrou que era fácil chegar à Torre Eiffel à pé, exatamente o que eu queria. Entrei da Avenue d'Iéna. Vazia. Completamente vazia. Apenas prédios lindos, com arquitetura maravilhosa. Ruas de pedra, com vários Citröens, Renaults e Peugeots estacionados em ilhas arborizadas eram a minha companhia naquela caminho sob a luz do sol às 20h. Eu pensei que nunca escureceria.

De um ponto da Iéna eu comecei a ver a Torre Eiffel novamente, com as luzes já acesas. Parecia que ninguém queria fazer aquele caminho, apenas o da Avenue Kleber, passando pelas estações Kléber, Boissière e finalmente descendo na Trocadéro. Como sempre, escolhi o menos óbvio. Passei pela Avenue des Nations Unites, em frente a uma praça onde um grupo de 3 pessoas fazia algum ritual religioso, que até agora eu não soube identificar. Andei mais um pouco e comprei um crepe de Nutella, já na frente da torre. Olhei o celular e tentei encontrar uma rede de wi-fi. De repente, todos batiam palmas e olhavam em direção ao Sena. Eu sabia que não era para mim, claro, então virei, curiosa. Às 22h, com o céu escurecendo, mas ainda banhado no mais belo azul, a Torre Eiffel brilhava. Sem perceber, deixei um monte de Nutella cair na roupa, e ainda sem perceber isso pedi para uma moça tirar uma foto minha com aquela vista maravilhosa.

A foto ficou linda.


Lá estava eu, assistindo a Torre Eiffel brilhar no começo da noite (sim) parisiense. Eu era uma das poucas pessoas que estavam sozinhas, e nesse momento entendi o por quê de tanto romantismo sobre esse incrível, belo e espetacular monumento. Na verdade, eu ainda não achei uma explicação para o que senti naquela hora. Eu apenas senti que aquela vista é do tipo que você precisa compartilhar com a pessoa mais importante da sua vida. Como se dois corações conversassem através do olhar e tudo o que a alma quisesse dizer fosse jorrado por sorrisos silenciosos. Naquele momento, eu senti que mesmo que o mais belo dos romances fosse escrito, ainda assim tudo o que era necessário ser revelado permaneceria calado.

Apenas atravessei o Sena. Vi que a roupa estava suja e tentei, em movimento, esconder a melequeira com a bolsa. No Champs de Mars, a grama estava completamente tomada por casais fazendo picnic sob a luz da lua, bebendo champagne e vinho e comendo baguete. Super simples. Super Paris.
Não sou do tipo que fica ressentida por não ter namorado. Pelo contrário, eu sou daquelas à favor de passar a juventude solteira, afinal tudo muda nessa fase, principalmente sentimentos, e pode ser que aquela pessoa a quem você dedicou parte de sua vida não seja a que você quer para sempre. Ou seja, pode ser uma perda de tempo e liberdade desnecessária (lembram o que eu disse sobre o coração com a temperatura um pouco abaixo do normal?). Nesse dia, portanto, foi diferente.

Eu queria naquele momento amar alguém. Queria muito ter alguém ao meu lado para beber vinho assistindo à Torre Eiffel brilhar. Queria dizer o mais sincero "eu te amo" da minha vida. Eu queria, mas sabia que não o faria. E isso, meus amigos, esse "efeito Torre Eiffel à noite" me fez caminhar à passos curtos enquanto saía do Champs de Mars, quase com a terrível promessa de que eu nunca mais voltaria à Torre Eiffel á noite, ao menos que estivesse com o amor da minha vida.

Não arrisquei. Apenas andei.

Andei, não chorando a Nutella derramada, mas pensando no futuro. E pensando no futuro, um belo homem de calça jeans, jaqueta de couro e cabelos arrepiados, mas de modo elegante, me perguntou: "are you Brazilian?". Movida pelo medo discreto de um belo estranho acertar sua nacionalidade de primeira, dei um sorriso, ainda andando. Confirmei. A tentativa do belo estranho de puxar conversa, no entanto, falhou. "Do you speak French? English? Portuguese? Spanish?" Novamente, apenas sorri, e me despedi, com uma nova promessa em mente... a de que não deixaria mais que o medo atrapalhasse minhas chances de realizar novos sonhos.